A vida no espaço

Segundo algumas doutrinas religiosas, a Terra é o centro do Universo e o céu arredonda-se como abóbada acima de nós. É na sua parte superior, dizem, que se assenta a morada dos bem-aventurados, e o inferno, habitação dos réprobos, prolonga suas sombrias galerias nas entranhas do próprio globo.

A Ciência moderna, de acordo com o ensino dos espíritos, mostrando-nos o Universo semeado de inumeráveis mundos habitados, trouxe um golpe mortal a essas teorias. O céu está em toda parte; em toda parte o incomensurável, o insondável, o infinito; em toda parte um formigamento de sóis e de esferas, dentre os quais nossa Terra é apenas ínfima unidade.

No meio dos Espaços, não há mais moradas circunscritas para as almas. Tanto mais livres são quanto mais puras, percorrem a imensidão e vão onde as levam suas afinidades e suas simpatias. Os espíritos inferiores, entorpecidos pela densidade de seus fluidos, ficam como que pregados ao mundo onde viveram, circulando na sua atmosfera ou misturando-se aos humanos.

As alegrias e as percepções do espírito não resultam do meio que ocupa, mas do seu estudo pessoal e dos progressos realizados. O espírito atrasado, com perispírito opaco e envolto em sombras, pode encontrar-se com a alma radiosa, cuja forma sutil presta-se às sensações mais delicadas, às vibrações mais extensas. Cada um traz em si sua glória ou sua miséria.

A condição dos espíritos na vida de além-túmulo, sua elevação, sua felicidade, tudo depende da sua faculdade de sentir e de perceber, que é proporcional ao seu grau de adiantamento.

Aqui mesmo, na Terra, vemos os gozos intelectuais aumentarem com a cultura intelectual. As obras literárias e artísticas, as belezas da civilização, as mais altas concepções do gênio humano permanecem incompreensíveis para o homem selvagem e mesmo para muitos de nossos concidadãos. Assim, os espíritos de ordem inferior, como cegos no meio da Natureza ensolarada, ou surdos num concerto, ficam indiferentes e insensíveis diante das maravilhas do infinito.

Esses espíritos, envolvidos em fluidos espessos, submetem-se às leis da gravidade e são atraídos para a matéria. Sob a influência de seus apetites grosseiros, as moléculas de seus corpos fluídicos fecham-se às percepções exteriores e os tornam escravos das mesmas forças naturais que governam a Humanidade. Não se deveria insistir muito nesse fato que é o fundamento da ordem e da justiça universais: as almas agrupam-se e se dispõem no espaço segundo o grau de pureza de seu invólucro; o lugar que ocupa está em relação direta com sua constituição fluídica, que é sua própria obra, a resultante de seu passado e de todos os seus trabalhos. Ela é que determina sua situação; é nela que se encontra sua recompensa ou sua dor. Enquanto que a alma depurada percorre a vasta e radiosa amplidão, demora-se à vontade nos mundos e quase não vê limites para o seu progresso, o espírito impuro não pode afastar-se da vizinhança dos mundos materiais.

Entre esses estados extremos, numerosos graus intermediários permitem aos espíritos semelhantes agruparem-se e constituírem verdadeiras sociedades celestes. A comunhão de pensamentos e de sentimentos, a identidade dos gostos, das visões, das aspirações aproximam e unem essas almas que formam grandes famílias.

A vida do espírito evoluído é essencialmente ativa, embora sem fadigas. As distâncias não existem para ele. Transporta-se com a rapidez do pensamento. Seu envoltório, semelhante a um vapor tênue, adquiriu uma tal sutileza que se torna invisível aos espíritos inferiores. Ele vê, ouve, sente, percebe, não mais através dos órgãos materiais que se interpõem entre a Natureza e nós e interceptam a passagem da maior parte das sensações, mas, diretamente, sem intermediário, através de todas as partes de seu ser. Suas percepções são, também, mais precisas e em maior número do que as nossas. O espírito elevado nada, de alguma maneira, no meio de um oceano de sensações deliciosas. Quadros que mudam, desenrolam-se à sua vista, harmonias suaves embalam-no e encantam-no. Para ele, as cores são perfumes, os perfumes são sons. Mas, por mais delicadas que possam ser suas impressões, pode delas subtrair-se e recolher-se à vontade, envolvendo-se com um véu fluídico, isolando-se no seio dos Espaços.

O espírito evoluído está liberto de todas as necessidades corporais. A alimentação e o sono não têm para ele nenhuma razão de ser. Partindo da Terra, deixa para sempre os cuidados vãos, os sobressaltos, todas as quimeras que envenenam a existência nesse mundo. Os espíritos inferiores levam consigo, além-túmulo, seus hábitos, suas necessidades, suas preocupações materiais. Não podendo elevar-se acima da atmosfera terrestre, voltam para participar da vida dos humanos, misturar-se às suas lutas, seus trabalhos, seus prazeres. Suas paixões, seus apetites, sempre despertos, superexcitados pelo contato contínuo com a Humanidade, acabrunham-nos e a impossibilidade de satisfazê-los torna-se para eles uma causa de tortura.

Os espíritos não têm necessidade da palavra para se compreenderem. Cada pensamento, refletindo-se no perispírito como uma imagem num espelho, trocam suas ideias sem esforço, com uma rapidez vertiginosa. O espírito elevado pode ler no cérebro do homem e desvendar seus mais secretos planos. Nada lhe fica oculto. Perscruta todos os mistérios da Natureza e pode explorar, à sua vontade, as entranhas do globo, o fundo dos oceanos, neles considerar as ruínas das civilizações desaparecidas. Atravessa os corpos mais densos e vê abrir-se diante de si os domínios impenetráveis do pensamento humano.

Se quiser conhecer mais sobre a vida espiritual leia o Livro dos Espíritos.

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